Centro de São Paulo. Caos. Gritos. “Tribos”. Velhos. Jovens. Iluminação. A explosão da arte, da cultura humana, paulistana e brasileira de uma só vez, em todo o canto que se olhava. Enquanto o velho novo Mutantes estourava saudades na incrivelmente lotada São João, logo ali, com a acústica protegida pelo Edifício Itália, Rogério Rochilitz afinava e desafinava num lindo piano de calda em show para poucos.
A diversidade enchia os olhos. Gente de muitos cantos. Jovens sem saber se olhavam para os palcos ou para a arquitetura da velha Sampa. Travestis e metaleiros se misturavam na República. O sol chegava ao pico do céu, os gramados cheios de cangas com a garotada, e os coroas - que, num tempo distante, posavam para as fotos enquanto estendiam bandeiras de contra-cultura - chegavam, sem mais deitar por cima do verde, só desviavam, calados. Metrô iluminado toda a madrugada; ah, se fosse sempre assim. Ônibus não, só depois das cinco.
Eu não sei se foi o clima da Virada Cultural, mas para tudo que eu olhava, via arte. Ela estava saltando das cores dos olhos e peles. Acredito que muito se perdeu, caso o cidadão tenha olhado somente para os holofotes. As galerias de arte, a Pinacoteca e os artesãos, índios urbanos. Cada um com sua galeria, de concreto ou de lona. Pintura em tela, em madeira, em papelão, em veludo, em papel aveludado. As gravuras não se contentavam em naturezas mortas, avançavam em borrões tão mais expressivos quanto dos grandes pintores contemporâneos. Esculturas pequenas de metal, postas estrategicamente no chão, confundiram-se com lixo e algém pisou nelas porque olhava para cima. “Blusa da Gal Costa, moça, baratinha! Se quiser, tenho uns artesanatos meus de brinde...” seduzia-me, um senhor barbudo e sujo.
Voltando para casa, num ônibus lotado, uns guris cantavam funk carioca e Pavilhão 9 (banda de rap paulista, homenagem ao famoso pavilhão do Carandiru). Dois começaram a discutir, diziam que se entenderiam na faca, logo mais, no ponto final. Foi o último espetáculo que assisti aquele dia.
Luciana Araújo
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Ah se a todo o momento pudéssemos escolher, entre mil opções, o que ver. Mesmo que obviamente não concordamos com tudo que chamam de cultura, mas essa é a nossa parte mesquinha de classificar o que gostamos como, sempre, algo superior e rebaixar o resto. Às vezes é mesmo. Mas sejamos compreensíveis sócio-culturalmente. A massa agrada a massa, e o fermento precisa ser mexido com uma colher animada, de ritmos frenéticos.
Infelizmente a distância, o espaço, entre as apresentações culturais de nossa escolha, é maior que a quantidade de passos entre a São João e o Teatro Municipal, então, não ficamos perdidos quanto a escolhas, e nem mesmo temos muita opção, o que aparecer agarramos com unhas e dentes para não escapar. Compre, compre seus convites com antecedência que a oferta é pouca! Sempre assim...
Quando aparece a grande virada, é realmente motivo para não dormir, e o povo fica nervoso mesmo, é uma correria, uma ansiedade... que loucura, nas últimas horas da programação é briga, é falta de comida, fila, é o pé latejando. Ainda bem que é pela a música, válido.
Ah...o Teatro Municipal... Quem foi apenas pela oportunidade de conhecer a beleza das internas, saiu inebriado, flutuante, diante da qualidade surrealista das apresentações. Só a lembrança retoma a vontade de aplaudir de pé. E salve os Paulos! Vanzolini, César Penheiro!
Talvez seja esse o caminho, dar esse boom cultural para balançar a atenção. O que não ficou claro é que cultura não pode ser tratada como entretenimento. E por favor, não vamos consumir como.
Thâmara M.